terça-feira, 31 de março de 2009

QUERIDOS AMIGOS, AGORA VOCES JÁ SABEM:


VINHEDOS MAIS TÓXICOS DO QUE OS TÍTULOS PODRES DO CITIGROUP
Muito antes que Richard Parsons, - Presidente do Conselho do Citigroup – voasse a Washington no mês passado, para discutir pela terceira vez o salvamento do banco novayorquino, outro personagem importante no mundo das finanças iniciou uma jornada similar a essa.
LORENZO DE MEDICI FOI A CAVALO
Com seu banco florentino à beira da falência, Lorenzo abandonou o esplendor do Palazzo Medici e galopou em direção ao sul e ao topo das colinas de Montalcino, para uma reunião com Guglielmo di Dattaro, presidente do Four Peacocks Bank, e proprietário de um vinhedo conhecido como Wolf Catcher’s Land. Lorenzo implorou a Dattaro que lhe emprestasse a quantia suficiente para comprar a produção de Wolf Catcher’s e assim poder escapar das conseqüências de falhar na obrigação de entregar ao Vaticano uma partida de vinho contratada.
Esta operação foi, possivelmente, o primeiro swap de crédito de vinho do mundo.
As uvas de Montalcino eram, à época, tesouro do reino, uma moeda corrente naquela era renascentista, que as famílias de banqueiros daqueles tempos, como os Medici, Strozzi e Gaddi lutavam para controlar. Alguns até usavam os vinhos que produziam para envenenar seus rivais.
Agora, séculos depois, parte de Wolf Catcher’s Land está de novo nas mãos de um banqueiro, Parsons, que no ano 2000, quando era presidente da Time Warner Inc. comprou um pedaço de 20 acres na propriedade chamada Il Palazzone. Ele se tornou Presidente do Conselho do Citigroup em fevereiro , depois que o conglomerado bancário, sufocado com seus próprios ativos tóxicos, confessou um prejuízo de U$ 37.5 bilh. e recebeu do governo uma ajuda de $45 bilh.
Em um artigo publicado no site do Il Palazzone, Parsons, que tem 61 anos de idade, disse que ser proprietário de um vinhedo “é o exato oposto do que eu faço no meu dia a dia”. A história, entretanto, contraria essa afirmação.


VINHO NEGRO
“Todos os banqueiros florentinos queriam o controle absoluto do vinho negro de Montalcino”, diz Bruno Bonucci – 77 anos – um historiador toscano que traçou o mapa dos proprietários do vinhedo até o século 13. “Vinho era uma importante moeda da época”.
Durante o século 16, o vinhedo de Parsons estava nas mãos do clan Strozzi, uma das mais poderosas famílias banqueiras da Europa. Cosimo I de Medici, Duque de Florença, mandou um agente secreto à Toscana em 1557 para matar seu arqui inimigo Piero Strozzi com uma taça de Montalcino. Quando a conspiração falhou, Cosimo atacou a cidade com seu exército e apoderou-se do vinhedo.
“Os Medici preferiam o vermelho profundo do Montalcino porque a cor mascarava convenientemente o gosto do veneno” diz Sheila Barker, professora assistente de história da arte na American University em Roma e especialista em banqueiros renascentistas envenenados, conforme o Medici Archive Project, em Florença.
“É difícil achar um só dia em que os Medici não estivessem tentando usar o vinho como meio de assassinar um banqueiro ou um político”, diz Barker, cuja tese de mestrado, intitulada “A Arte do Veneno” talvez possa ser considerada o mais completo manual em ofertas de mercado hostis. “Aquele era um mundo financeiro de tiranos”.
QUATRO ESTAÇÕES
Folheando a correspondência escrita em tinta vegetal entre os Medici e seus agentes, Barkes afirma que o vinho que Parsons agora vende ao restaurante Four Seasons pelo preço de $210 a garrafa, era conhecido, originalmente, como “vinho de banqueiros”.
“Os Medici foram responsáveis por fazer com que o vinho fosse parte indispensável do cotidiano de qualquer comerciante influente naquela época”, diz Barker. “Daí usavam o vinho para envenenarem-se uns aos outros nos almoços de negócio”.
Ninguem estava imune às intrigas encharcadas de vinho dos Medici. Consta de uma carta escrita em código numérico no ano de 1587, e decodificada por criptógrafos, que Ferdinand de Medici ofereceu a um empregado 4.000 escudos (o equivalente atual seria $1.28 milhões) para que esse empregado envenenasse o Montalcino favorito de seu irmão mais velho, Francesco.
VENENO DE VÍBORA
“Um pouco de veneno está sendo mandado a você, feito apenas para este propósito”, dizia a carta. “A quantidade total é suficiente para envenenar uma garrafa inteira de vinho, e não use menos do que isso. Não tem cheiro, nem gosto, e tem efeitos extremamente poderosos, desde que seja misturado bem e completamente ao vinho”.
Mas a gerente geral dos vinhedos de Parsons, Laura Grey, afirma que os membros do conselho do Citigroup não têm qualquer motivo para ficarem preocupados.
“Nosso lema é “Nós bebemos tudo o que conseguimos e vendemos o resto” , diz Gray, que, com seu marido Mario tem transformado as uvas Sangiovese de Il Palazzone em Brunello desde que Parsons comprou o vinhedo e suas duas mansões de pedra. Qualquer vestígio de arsênico ou de veneno de víbora da Libia – os preferidos dos Medicis – já evaporou há muito tempo.
Não há heliponto no Il Palazzone. A acidentada estradinha de terra até o vinhedo é mal cuidada e cheia de buracos. Deslizamentos são comuns. Embora habitantes do local afirmem que Parsons pilota um Fiat Punto quando ele visita a propriedade cada mês de setembro, para ajudar na colheita, o conselho de Gray é que o modo mais fácil de chegar ao local é em lombo de burro, colina abaixo despois da máquina de lavar roupas abandonada ao pé de algumas oliveiras.
PRODUTORES DE BRUNELLO
“Nós temos uma política de portas abertas”, diz Gray, abrindo uma garrafa de Riserva 1998, uma das cerca de 8.000 produzidas naquele ano e iniciando uma aula em ativos líquidos nesta cidade de 2.000 habitantes e 4.119 acres de vinhedos Brunello.
O melhor da produção está no que Gray chama de “Boy’s Room”, uma pequena sala com um portão e um cadeado que raramente está trancado, forrado com prateleiras de madeira que guardam 726 garrafas da reserva pessoal de Parsons.
Em 1999, Parsons foi jantar no La Fortezza Del Brunello, um restaurante em Montalcino que, na época, pertencia a Gray e a seu marido Mario. “Eu servi a Richard sua primeira taça de Il Palazzone”, relembra Gray. “Ele comprou 20 caixas, daí voltou e comprou o vinhedo”.
O preço atual de vinhedos em Montalcino é de $600.000 por um hectare de terra, ou 2.4 acres, diz Enrico Viglierchio, o homem que, aos 43 anos de idade é o gerente geral de Banfi Srl., o maior dos 202 produtores registrados de Brunello. Apenas 10 acres de Il Palazzone são liberados para cultivo. A estes preços, Il Palazzone deve ter custado a Parsons $2.5 milh.
“O CAOS DE NOVA YORK”
Se, quando comprou o vinhedo, ele tivesse usado aquele dinheiro para comprar ações do Citigroup, o investimento estaria hoje valendo $125.000, suficiente apenas para comprar 32 garrafas de Biondi-Santi Brunello di Montalcino Riserva, safra de 1953, proveniente da mais famosa adega da região.
Viglierchio diz que a compra de Il Palazzone por Parsons, foi um investimento em “medicina mental”.
“Brunello é um vinho que os banqueiros bebem para esquecer suas perdas”, diz ele.
Se é verdade o que Parsons diz no artigo publicado no web site do Il Palazzone, ou seja, que ele teria vindo a Montalcino para escapar do “caos de Nova York”, então é melhor que ele se prepare para um conjunto diferente de preocupações. Para começar, há o potencial impacto da crise financeira global nas vendas de Brunello, além da necessidade de aporte de capital. Gray diz que seu patrão está investindo 663.700 euros ($895.000) em novos equipamentos.
O ESCANDALO DA UVA
E tem também o escândalo da uva correndo solto na região. O Promotor Público de Siena, Nino Calabrese, determinou ao Esquadrão de Repressão a Fraudes Financeiras que suspendesse todas as exportações de Brunello di Montalcino no ano passado, atendendo uma denúncia anônima de que algumas partidas da safra de 2003 teriam sido feitas com outras uvas que não as Sangiovese, que são as autorizadas. O bloqueio durou 4 meses, causou a apreensão de 200.000 mil garrafas suspeitas e colocou em quarentena 10 vinhedos.
O caso não envolveu pequenas propriedades como Il Palazzone. E a produtora teve a sorte de já ter embarcado para exportação o seu estoque da safra de 2003 antes da ordem de bloqueio, diz Gray. O affaire todo, entretanto, foi uma lembrança da história de vilanias que cerca o vinhedo.
“Eu não bebo vinho, assim eu realmente não saberia dizer nada a respeito da qualidade da produção do Il Palazzone”, diz Alessio Assonitis, coordenador de pesquisa no Projeto dos Arquivos Medici e também um cliente do Citigroup. “Mas é inegável o valor histórico do vinhedo de Parsons. Todos banqueiros importantes do século 15 – Valori, Fondi, Gaddi – cobiçavam aquele vinho. Era o mais valioso de seus ativos e, como historiador, não posso esquecer que eles usavam o vinho para envenenar seus clientes”.
(Artigo da autoria de A. Craig Copetas, publicado no site da Bloomberg dia 25 de março de 2008, tradução livre por Zélia Gianello de Oliveira).

Dra. Zélia Gianello de Oliveira.